Hernanes, o profeta playmaker
Como profundo apaixonado por basquetebol, eu sempre tentei trazer alguns conceitos arraigados na cultura norte-americana de esportes para o nosso futebol de cada dia. Algumas coisas poderiam ser copiadas, como o profissionalismo presente em todas as áreas. Mas no aspecto de jogo, apesar de serem esportes completamente distintos, no fim das contas tanto lá como cá o que conta é o poder do conjunto, assim como em todos os esportes coletivos.
E há na cultura norte-americana um conceito bastante interessante que é o do playmaker. No meu texto apocalíptico de algumas semanas atrás sobre a saída do Thiago Maia do time do Santos (leia aqui), eu usei esse conceito mas não citei a nomenclatura. Basicamente, o playmaker é aquele jogador que tem como maior virtude melhorar seus companheiros de equipe. Quando ele está em campo, todos ao seu redor melhoram.
Essa é uma característica rara de se encontrar num atleta e fica mais clara quando se usa um outro conceito estatístico chamado plus/minus, que nada mais do que é do que analisar o desempenho de um time quando esse jogador está em campo, comparando com quando ele não está. A estatística ou scout é uma arma poderosíssima, mas que se não usada direito pode complicar mais do que solucionar. E se é algo que os americanos sabem fazer é trabalhar com elas.
Para exemplificar, há pouco mais de um mês houve o NBA Draft 2017, que é o evento onde as franquias escolhem os jovens e promissores jogadores das universidades para adentrar em seus times profissionais. São duas rodadas de 30 escolhas, ou seja, 60 garotos são contratados. Quem acompanha anualmente o trabalho das franquias durante o Draft sabe o valor eles dão para as estatísticas.
E uma das coisas que me chamou nesse último evento especialmente foi o entusiasmo de um dos maiores jogadores de basquete de todos os tempos e que agora é o mandachuva dos Los Angeles Lakers, Magic Johnson. Ele escolheu um armador na segunda pick geral chamado Lonzo Ball. Ao contrário de seus concorrentes diretos, Ball não é um pontuador nato, aquele jogador capaz de se tornar um futuro Michael Jordan, que sai por ai voando. Ao ser perguntado sobre o porquê da escolha, Magic resumiu: “com ele, todos os jogadores melhoram”.
Essa característica é tão rara que um dos maiores nomes do esporte abdicou de jogadores que teoricamente poderiam ter um impacto maior na Liga logo de cara. No futebol não é diferente. Há jogadores que, ao sair do time, a queda do conjunto é imediata, não só pelas suas capacidades técnicas e poder de fogo para decidir as pelejas, mas pelo quanto eles fazem seus companheiros crescerem. Esse é o verdadeiro playmaker.
No sábado, após a linda virada do São Paulo sobre o Botafogo, o técnico Dorival Júnior falou a mesma coisa sobre Hernanes. E nada é mais impactante do que a opinião do comandante do time, o cara que treina todos os dias com os jogadores. Eu não me lembro do mesmo Dorival ter tido uma análise assim sobre algum atleta em quase três anos de Santos.
Claro, ainda é muito cedo para se ter qualquer tipo de avaliação sobre o quanto esse Hernanes, versão 2017, pode contribuir para um time que sofre na tabela. No entanto, o verdadeiro playmaker não se faz apenas dentro de campo e em seu primeiro jogo pudemos ver que o meia já estava com a faixa de capitão do time. Com toda a sua experiência como treinador, não acredito que Dorival o entregaria a faixa apenas por marketing. Para mim é claro que o impacto Hernanes no São Paulo foi muito positivo para o elenco. E depois dessa virada histórica, a coisa deve começar a deslanchar pelos lados da Vila Sônia.