Perdi a vontade
Lamento, caro leitor, que os bastidores da Copa de 2014 venham nos tomando tanto tempo.
Sendo bem sincero, a última coisa que eu queria era escrever sobre isso, hoje. Minha vontade, mesmo, era de bater um papo sobre a seleção, sobre Copa América, sobre o ótimo time do Corinthians.
Mas não consegui. Ontem, ao ouvir uma notícia no rádio, foi despertado em mim um sentimento que nunca pensei que seria capaz de sentir. Um sentimento que me fez lembrar de um dia em específico. Um dia nem tão distante assim.
Esse dia era 11 de Junho de 2010. Naquela manhã, acordei com uma sensação que não sentia há exatamente 4 anos.
Quase caí da cama. Em poucos segundos, sem tomar café nem nada, já estava na frente da TV, com o álbum numa mão e uma cerveja na outra. Na minha cabeça, passavam imagens de Ronaldo, Romário, Zidane, Taffarel. Parecia que eu tinha 7 anos, de novo.
Em algumas horas começaria África do Sul e México, a abertura da Copa de 2010. Tudo: a vibração da torcida africana, a alegria dos jogadores ao marcarem um gol, a sensação de estar conectado à humanidade inteira em torno de uma só paixão, me dava vontade de pular e cantar, como se estivesse no estádio.
Vibrei com cada instante do torneio, apesar do baixo nível técnico. Me emocionei ao ver o meia sérvio Jovanovic pular a placa de publicidade pra comemorar um gol com seus compatriotas. Me emocionei ao ver os ingleses ditos “frios” comemorarem o gol de Gerrard como se tivessem vencido uma guerra. Me emocionei ao ver as lágrimas de Maradona. Quase infartei quando o Uruguai se classificou para as semi-finais.
Porque todos esses momentos, não tenho dúvida, só podem ser proporcionados por uma Copa do Mundo, independentemente do quanto nossa paixão clubística possa superar nosso amor pela pátria.
Por tudo isso, devo confessar que, mesmo em meio à cena grotesca de políticos e cartolas abraçados no anúncio da Copa de 2014 no Brasil, a primeira coisa que pensei não foi nem na corrupção, na CBF, na farra da grana pública, na FIFA. Pensei, isso sim, que pela primeira vez na minha vida teria a chance de presenciar um jogo de Copa no estádio, de ver todos meus sonhos de infância diante dos meus olhos. Coisa que sempre foi uma das minhas maiores vontades.
E, veja: nunca pensei que perderia essa vontade. Pois isso aconteceu ontem.
De madrugada, ouvi a notícia: a FIFA pressionou, e o ministro dos esportes Orlando Silva, claro, topou: os jogos da Copa no Brasil não terão meia-entrada.
Foi a gota d’água.
Sim, leitor: os idosos que trabalharam a vida inteira para pagar seus impostos em dia e, hoje, vêem esses mesmos impostos irem para o bolso da Odebrecht, do Andrés Sánchez, do Ricardo Teixeira, etc, não terão SEQUER, o direito de pagar metade para ver um jogo de futebol em seu país. Tampouco estudantes e professores.
Enquanto isso, os amiguinhos de Teixeira, o Kassab (DEM), o Alckmin (PSDB), o Agnaldo Timóteo (PR – aquele que chegou na cerimônia do Itaquerão se dizendo “papagaio de pirata”), a mídia chapa-branca (leia-se Globo e Sportv), esses vão entrar no estádio DE GRAÇA.
Tudo isso, na mesma semana em que o governo de São Paulo aprovou 50 milhões de reais dos cofres públicos para as bancadas do Itaquerão, sem falar nas isenções fiscais de mais de 420 milhões que a prefeitura já anuciara.
Foi demais pra mim. Nunca pensei que esse dia chegaria, mas ele chegou: perdi totalmente a vontade de ver a Copa do Mundo no Brasil.
E só peço um ato de misericórdia dos donos do nosso esporte: não façam o Campeonato Brasileiro parar em Junho de 2014. Passar um mês sem futebol é difícil para quem é apaixonado que nem eu.
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Só pra não terminar a coluna em tom de desesperança, já está no ar o site http://www.foraricardoteixeira.com.br/, que publicará todas as tuitadas com a hashtag #foraricardoteixeira.
E pra dar um pouco de risada disso tudo, um vídeo muito bom do comediante Marcelo Adnet: